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A suposta disputa instalada entre Banco Central (BC) e Tesouro Nacional em torno dos títulos da dívida pública federal negociados no mercado doméstico tem potencial para dar ao país um duplo prejuízo: dificultar a venda definitiva de papéis aos investidores e atrapalhar a gestão da liquidez no mercado aberto. A administração da dívida brasileira interna e externa é tarefa exclusiva do Tesouro. Calibrar a liquidez no sistema bancário é tarefa exclusiva do BC. Se o Tesouro falhar na bem-sucedida gestão da dívida, que mudou de perfil e radicalmente para melhor na última década, o Brasil sofrerá grande retrocesso. O Brasil do overnight e da inflação na lua tem a oferecer, hoje, papéis soberanos com vencimento até 2050. Mas se o BC não conseguir manter a oferta de moeda em nível adequado para dar suporte à taxa de juro de curto prazo – que deve estar alinhada à Selic – inflação na casa de 6% ao ano é pouco. Portanto, não existirá na “disputa” entre BC e Tesouro na busca por investidores para comprar títulos federais, temporariamente ou em caráter definitivo, um falso dilema ou reflexo de uma realidade desfocada no espaço e no tempo?
 
Todo cuidado é pouco quando o assunto é Tesouro, BC, administração da dívida mobiliária e política monetária, porque não é pequeno o montante de dinheiro comprometido com risco “zero” da República. As operações sob responsabilidade dos dois órgãos somam R$ 2,5 trilhões. O Tesouro cuida de R$ 1,85 trilhão de dívida. O BC, de aproximadamente R$ 650 bilhões garantidos em títulos emitidos pelo Tesouro, mas que já estão em sua carteira e transitam pelo mercado financeiro em vendas temporárias a investidores com data determinada para recompra pelo BC, nas “operações compromissadas”.
 
Os avanços na administração da dívida pública são incontáveis nos últimos anos. E o controle da inflação também, ainda que o centro da meta seja mero figurante no regime brasileiro. É uma visão simplista supor que a concentração explosiva de reais nas “operações compromissadas” do BC seja resultado da concorrência entre as instituições oficiais. Até porque a base do dinheiro hoje fartamente empilhado na contabilidade do BC foi gerada por uma decisão de governo que livrou o país de poucas e boas durante a crise financeira global de 2008/2009: a acumulação de reservas internacionais. Para pagar os dólares comprados no mercado à vista, o BC emitia reais. E para que os reais não ficassem zanzando pela economia e flertando com a inflação, o BC vendia temporariamente papéis públicos tirando dinheiro de circulação.
 
Os reais, filhotes das reservas cambiais, somados aos reais dos resgates de títulos públicos que não foram substituídos totalmente pelo Tesouro e à liberação de depósitos compulsórios dos bancos para fins diversos nos últimos anos levaram a uma oferta de dinheiro nos bancos que só cresceu. Não parou mais. Em outubro do ano passado, o BC decidiu alongar o prazo dessas “operações compromissadas” por 90 e 180 dias. E, há duas semanas, optou por reprisar diariamente a opção das aplicações por 90 dias em lotes de R$ 5 bilhões. Essa rolagem, que já tirou de circulação R$ 40 bilhões em onze dias, é remunerada e daí surgirá uma taxa referencial prefixada de 90 dias – talvez o embrião de um futuro juro interbancário prefixado, hoje denominado em CDI.
 
Especialista em política monetária, o economista Márcio Garcia, professor da PUC-Rio em visita ao MIT Sloan School neste ano, não tem dúvida sobre a conveniência de o BC desconcentrar os recursos do curto prazo. Em entrevista ao blog Casa das Caldeiras por telefone, Garcia alertou que não só o alongamento é importante, mas também a distribuição dos vencimentos das “operações compromissadas” em diversas datas, lembrando que o imponderável às vezes acontece. “Vai que o Bernanke [Ben Bernanke, presidente do Federal Reserve, o BC americano] decide elevar o juro de repente em 5 pontos. O que nos acontece, se neste dia ocorrer uma grande rolagem de operações? O BC fica obrigado a elevar o juro para retirar o dinheiro do mercado? Já assistimos a momentos semelhantes no passado, nunca de tamanha concentração de recursos nas compromissadas, mas toda rolagem é arriscada no curto prazo porque algumas situações as autoridades monetárias simplesmente não controlam.”
 
Garcia estranha, porém, o fato de o Tesouro não vender títulos para retirar os recursos excedentes de circulação. Mas reconhece que um aplicador sempre prefere a liquidez – à não liquidez – se tem rendimento garantido. A preferência recai pelo prazo mais curto. Isso é natural, na sua opinião. Mas manter o dinheiro no curto prazo, ou não, também pode ser uma questão de preço. Daí a pergunta: estão pagando um preço adequado para o investidor abrir mão do curto prazo ou falta indexador adequado para assegurar aplicações em prazos mais longos? O economista não descarta a possibilidade de a redução forte do estoque de LFT (título indexado à Selic) no último ano ter contribuído para o deslocamento de recursos para as “compromissadas” do BC.
 
Seja qual for a razão da concentração de moeda no curto prazo, Garcia defende que BC e Tesouro enfrentem juntos a situação ao ser informado que analistas veem nas “compromissadas” do BC uma “concorrência predatória” aos leilões do Tesouro. Na semana passada, o BC pagou 7,74% ao ano em uma operação compromissada de 90 dias ou o equivalente a 102,30% do CDI, enquanto uma LTN de prazo semelhante oferecia retorno de cerca de 101,5% do CDI. Outro atrativo da compromissada em comparação à compra definitiva de papel do Tesouro é o fato de o aplicador de dinheiro na “compromissada” não ter a obrigação de enfrentar o risco imposto em momentos de maior volatilidade no mercado, já que a recompra pela autoridade é garantida. Mas o Tesouro, ainda que não vendendo lotes gigantescos de títulos, tem feito leilões importantes. Apenas na última semana, vendeu R$ 11 bilhões de LTNs com prazos de cinco meses a quase quatro anos, taxas levemente decrescentes e demanda firme pelo prazo mais longo.
 
Fonte: Valor Econômico / Angela Bittencourt / Lucinda Pinto – 03.05.13

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