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Estes são tempos desconfortáveis para presidentes de bancos centrais. No passado, os monstros sagrados da profissão, que reuniram-se neste mês, em Jackson Hole, Wyoming, já chegaram a ser os supremos senhores do universo. Agora eles estão perturbados pela dúvida.
 
Quatro anos após o pior momento da crise financeira, o desemprego permanece elevado em todo o mundo desenvolvido e a economia mundial está perdendo força. Pairam, ameaçadores, grandes riscos irradiados da zona do euro e da política fiscal americana.
 
Após a decisão do Banco Central Europeu (BCE) de combater especulações sobre uma ruptura da zona do euro propondo-se a comprar títulos de curto prazo dos governos de países periféricos europeus, o Fed (Federal Reserve, banco central dos EUA) deverá, nesta semana, decidir sobre a melhor forma de ajudar uma economia que seu presidente descreveu como “longe de satisfatória”.
 
Mas, quanto mais os banqueiros centrais aprofundam suas análises de soluções para os problemas das economias desenvolvidas, mais ficam preocupados alguns economistas.
 
“Eu estou um pouco – talvez mais do que um pouco – preocupado com o futuro das decisões dos bancos centrais”, disse James Bullard, presidente do Federal Reserve Bank de Saint Louis, em entrevista ao “Financial Times” em Jackson Hole. “Nós sempre achamos que haveria luz no fim do túnel e que haveria oportunidade para uma normalização, mas não é o que está realmente acontecendo até agora.”
 
“O que me preocupa é essa politização [que temos visto]”, disse Bullard. As pressões dos políticos muitas vezes são no sentido de que os bancos centrais ajam mais.
 
A maior preocupação visível em Jackson Hole era sobre se esses burocratas, posicionados no coração de cada economia madura, ainda detêm o poder de influenciar a demanda, agora que as taxas de juros não podem cair muito mais. À espreita, por trás de muitos debates, há a indagação: se as políticas dos bancos centrais são tão eficazes, por que a economia mundial não está crescendo mais rápido?
 
Para obter uma resposta, muitos recorrem às ideias de Carmen Reinhart e Kenneth Rogoff, que descreveram como recuperações pós-crises financeiras tendem a ser lentas e dolorosas, em seu livro “This Time is Different” (“Desta vez é diferente”).
 
No entanto, todo o ativismo dos bancos centrais nos últimos quatro anos baseia-se na crença em que, embora esta crise possa ser semelhante às do passado, deve, necessariamente, haver um coquetel de políticas que desta vez tornarão a recuperação diferente.
 
Todavia, essa fé está sendo questionada.
 
“Devo confessar que quando o livro foi publicado eu estava um pouco cético sobre se isso iria acontecer nos EUA, mas eles [os autores] estavam certos e eu estava errado”, disse Alan Blinder, professor de economia em Princeton e ex-vice-presidente do Fed, do púlpito em Jackson Hole. “Nós não nos desviamos muito do padrão de uma recessão [do tipo descrito por] Reinhart-Rogoff.”
 
Existem algumas razões possíveis pelas quais repetidas rodadas de comunicados e de flexibilização quantitativa pelos bancos centrais – como é conhecida a política de compra de ativos de mais longa maturação, num esforço para reduzir as taxas de juros de longo prazo -, não produziram uma recuperação vigorosa.
 
Uma das razões é que algo estrutural mudou, e isso está contendo o crescimento. Falando no plenário em Wyoming, Donald Kohn, outro ex-vice-presidente do Fed e hoje na Brookings Institution, levantou a possibilidade de “algo mais profundo estar acontecendo”, talvez relacionado ao comportamento da poupança ou da modificada distribuição de renda entre o capital e o trabalho.
 
Outra razão é que as ferramentas funcionam, mesmo que as condições atuais neutralizem seu efeito. Se houver novos ventos contrários, então a resposta será usá-los de forma mais agressiva. Essa é a visão predominante entre os presidentes de BCs.
 
“Uma leitura equilibrada das evidências dá sustentação à conclusão de que as compras de títulos pelo BC proporcionaram substancial suporte à recuperação econômica, ao mesmo tempo em que amenizaram os riscos deflacionários”, disse Ben Bernanke, presidente do Fed, em seus comentários em Jackson Hole.
 
Uma terceira possibilidade é, talvez, a mais alarmante para um presidente de um banco central, como Bernanke, que aposta sua reputação em sucessivas rodadas de afrouxamento quantitativo: elas simplesmente não funcionam.
 
Em sua apresentação em Jackson Hole, Michael Woodford, professor na Universidade Columbia, apresentou evidências de que até onde as compras de ativos produziram uma redução nos juros de longo prazo nos EUA, seu efeito foi indireto. As pessoas encararam as compras como um sinal de que os juros de curto prazo permanecerão mais baixos por mais tempo, argumentou ele.
 
Esse estudo deu aos presidentes de BCs reunidos algum material para reflexão, mas terá pouca influência em suas escolhas políticas imediatas.
 
Após a divulgação de que em agosto foram criados 96 mil empregos, abaixo das estimativas e menos do que o suficiente para afastar a “grave preocupação” de Bernanke quanto a uma estagnação do mercado de trabalho, o Fed tem três opções a considerar, ao realizar a sua reunião de dois dias, nesta semana.
 
O Fed poderia comprar mais ativos, em outra rodada de alívio quantitativo (o chamado “QE”). O BC poderia estender sua previsão de juros baixos para além da data atualmente prevista: final de 2014. Ou poderia cortar os 25 pontos-básicos de juros que paga aos bancos sobre suas reservas em excesso.
 
Bernanke passou a maior parte de seu discurso falando sobre os prós e contras de mais compras de ativos, e o QE3 continua sendo a principal opção do Fed para um estímulo substancial. Uma ideia que conquistou bastante terreno na Comissão Federal de Mercado Aberto (o Fomc) é promover ações sem contornos definidos: comprar uma quantidade qualquer por mês ou realizar reuniões sem meta definida.
 
A dificuldade está em como definir um objetivo. Membros mais agressivos da Comissão de Mercado Aberto querem liberdade para decidir parar de comprar ativos em qualquer reunião. Os moderados querem um comprometimento no sentido de continuar comprando até que uma (determinada) condição de melhoria da economia seja cumprida. Eles querem que essa condição, muito provavelmente em palavras e não em números, subentenda um QE3 substancial, a menos que a economia se recupere.
 
Um problema semelhante se aplica à alternativa de estender a previsão, pelo Fed, de juros baixos até 2015. Os moderados não gostariam que isso fosse interpretado simplesmente como uma previsão de que a economia continuará fraca. Em vez disso, eles gostariam de sinalizar uma mudança no comportamento do Fed, e que o BC pretende manter os juros baixos, mesmo à medida que a economia se recupere.
 
O que o Fed fará dependerá de se a comissão conseguirá chegar a um consenso sobre tal condição (sinalizadora) de uma melhoria da economia. Se não conseguir, então será mais provável uma compra, pura e simples, de uma bolada de ativos.
 
A última opção, baixar os juros sobre as reservas, tornou-se um pouco mais provável, já que o BCE reduziu a zero os juros com que remunera os depósitos no “overnight” sem causar um apocalipse no sistema financeiro. Mas poucos técnicos no Fed julgam que isso faria muita diferença, e alguns continuam a ver riscos modestos. Certamente, essa opção é improvável, exceto associada a outras ações.
 
Mas não é apenas o Fed que está às voltas com difíceis questões de política. O BCE está diante de uma ameaça de desintegração da moeda única e de um processo político internacional dolorosamente lento.
 
Sua mais recente resposta foi a promessa de compra de títulos dos países europeus que aceitaram as condições potencialmente abrangentes de um programa de consolidação fiscal e de reformas econômicas – potencialmente em quantidades ilimitadas. Comprando títulos apenas de curta maturação, o BCE vê isso como uma operação de política monetária visando trazer as taxas de juros de curto prazo de volta a uma harmonia em toda a zona do euro. O banco central quer eliminar o prêmio de risco de desvalorização dos títulos soberanos de alguns países.
 
Mas a operação acordada – puras transações monetárias – é extremamente polêmica, e o Bundesbank, o ultraconservador BC alemão, a vê “como equivalente a financiar governos imprimindo dinheiro”. Além disso, o BCE vê o perigo de que, se as coisas derem errado, as compras potencialmente ilimitadas de títulos “possam, em última instância, redistribuir riscos consideráveis entre os contribuintes do fisco em vários países” da zona do euro.
 
No Reino Unido, o Banco da Inglaterra (BoE, em inglês) abandonou a compra de títulos do governo na esperança de reduzir os juros de longo prazo para tentar intervir mais diretamente no sentido de reduzir os custos de financiamento das famílias e das empresas.
 
Assim como o Fed, o BC britânico insiste em que o QE está funcionando. Mas o BoE está botando muita fé na ideia de que, ao disponibilizar financiamento barato aos bancos sob a condição de que eles intensifiquem os empréstimos à economia real, isso impulsionará a demanda.
 
Mas há outras sugestões em discussão, algumas chegando bastante perto de uma linha arbitrária que os banqueiros centrais temem pisar: a linha divisória entre política monetária e política fiscal.
 
Alguns consideram útil um pré-engajamento em estímulos de política até que esta funcione. Woodford defende um comprometimento no sentido de manter os juros baixos por um período que seja vinculado ao desempenho da economia. Ao manter os juros baixos, apesar de um crescimento da inflação um pouco acima de uma meta como os 2% estipulados pelo Fed, um banco central poderia compensar o período em que a taxa de juros ideal teria sido inferior a zero.
 
E um número crescente de vozes, muitas vezes não aquelas muito próximas dos círculos que definem a política do BC, mas que, reservadamente, incluem alguns que pertencem ao clube, sugere que os bancos centrais poderiam tornar-se ainda mais radicais. Os BCs estão sendo exortados a comprar ativos que não sejam títulos do governo, rompendo com um tabu segundo o qual eles não devem aceitar riscos de crédito em seus balanços patrimoniais.
 
Embora nada disso seja palatável, é melhor do que as ideias realmente radicais que podem ganhar ímpeto se o mal-estar econômico persistir, como a infame opção de “lançar dinheiro de helicópteros”. Um banco central pode simplesmente lançar um crédito nas contas bancárias dos cidadãos de um país, aumentando diretamente a renda durante um período e incentivando-os a gastar.
 
Uma variante dessa proposta é financiar temporariamente os gastos do governo, permitindo que este corte impostos durante um período. Esse financiamento monetário do governo é proibido por lei, na Europa, pela boa razão de que, quando foi experimentada, a impressão pura e simples de dinheiro terminou em hiperinflação. Uma economia não tem como disponibilizar bens e serviços suficientes equivalentes a todo o dinheiro recém-criado ao nível de preços vigentes – e a inflação se instala.
 
Conservadores por natureza, nenhum banqueiro central quer considerar ideias que são tabus há décadas. Mas algumas dessas ideias estão começando a ser aventadas.
 
Os manuais de economia não estão fornecendo as respostas. Quando isso acontece, opções mais radicais vêm à tona.
 
Os bancos centrais empenharam-se arduamente para vender a ideia de metas de inflação. Adotando uma “meta final para o Produto Interno Bruto nominal”, uma ideia que vem ganhando corpo em círculos acadêmicos, seria ainda mais difícil de explicar.
 
Mesmo assim, isso pode ser a melhor solução possível para o problema de que as taxas de juros não podem ser negativas.
 
Essa política, defendida recentemente por Michael Woodford, na Universidade Columbia, significaria duas mudanças para os bancos centrais.
 
Primeiro, o banco central assumiria como meta o aumento dos gastos em dinheiro na economia – o PIB nominal inclui o crescimento real mais a inflação -, em vez de considerar apenas preços.
 
Mas, em segundo lugar, e o que é mais importante, o BC assumiria como meta um nível em constante crescimento para o PIB nominal, em vez de apenas a taxa atual de crescimento.
 
Isso é crucial, porque vincularia à inflação futura a condições do passado. Se o crescimento nominal do PIB for muito baixo, o banco central teria de permitir que uma inflação mais alta o levasse de volta ao caminho para a meta.
 
Se um banco central, como o Fed, tivesse adotado como meta um caminho para o PIB nominal nos últimos anos, os mercados automaticamente assumiriam taxas de juros nulas durante alguns anos, já que existe uma grande disparidade a ser eliminada. Se o banco central prometesse gerar suficiente inflação para retornar, eventualmente, à trajetória que conduz à meta, as pessoas não teriam nenhuma razão para evitar gastar – e suas expectativas para o futuro contornariam o problema de que as taxas não podem cair abaixo de zero hoje. Woodford e economistas como Paul Krugman e Christina Romer defendem a política precisamente por essa razão.
 
Os bancos centrais preocupam-se com comunicação. Uma meta para o PIB nominal praticamente assegura que os BCs teriam, por vezes, de assumir uma meta de inflação superior a 2%, e eles temem que haveria um custo para sua credibilidade.
 
Eles também se perguntam como cumprirão sua promessa de maior inflação em tempos, como o atual, quando o único instrumento de política imediato é a flexibilização quantitativa.
 
Pode ser particularmente difícil adotar essa meta agora, quando a economia está tão distante de sua trajetória pré-crise, o que implica muita inflação para cobrir a distância. Mas as justicativas para uma mudança são fortes e estão ficando cada vez mais fortes.
 
Ideias acadêmicas bem sucedidas geralmente levam tempo para ganhar aceitação entre os formuladores de políticas e, por isso, metas para o PIB nominal não estão prestes a ser implementadas. Mas fiquem de olho nos bancos centrais escandinavos. Eles são, muitas vezes, os primeiros a adotar novas ideias.
 
Fonte: Valor Econômico/ Financial Times/ Robin Harding/ Chris Giles – 12/09/2012

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